O começo de um novo ano é sempre mais uma oportunidade de fazermos um balanço das coisas que passaram para podermos aprender com nossos erros e fazer mudanças nas estratégias. Isso funciona para tudo, trabalho, vida pessoal, relacionamentos e, logicamente, treinos...
Há alguns dias atrás estava fechando o “balanço dos treinos”, computando horas e quilometragem nas modalidades e como faço todo final de ano coloquei no papel coisas que funcionaram, erros que cometi e coisas que eu deveria ter feito mas não fiz. E, ao cruzar com informações de anos anteriores algumas idéias apareceram...
Começo de temporada é sempre a mesma história, a gente acha que a grande diferença para o ano inteiro pode ser feita aqui, em dezembro, janeiro e fevereiro... bom, isso é uma meia verdade (ou uma meia mentira pra quem prefere ver o copo meio vazio J).
Alguns alicerces para o ano são com certeza firmados nesse período, mas muito cuidado é necessário.
Eu tinha a mania de pensar que todo o volume do mundo era pouco nesse período, principalmente em anos que eu fazia Ironman. Cansei de fazer quilometragens absurdas, semana após semana durante o chamado “período de base”, vários dias consecutivos de mais de 5h em cima da bike, e obviamente em intensidades ridiculamente baixas...
“Se pedalar MUITO e DEVAGAR trouxesse algum benefício, o carteiro da região era campeão do Tour de France” – Bernard Hinault
Em 2007 tive a oportunidade de passar 5 dias treinando com a equipe de ciclismo de Ribeirão Preto enquanto eles se preparavam para a Volta do Estado de São Paulo.
Quando o técnico deles me convidou disse que seriam 5 dias de muito treino, longos e as vezes em dois períodos – ha... tiro de letra, já cansei de fazer volumes insanos em cima da bike, pensei.
Foram os 5 dias de maior sofrimento, e posteriormente de maior aprendizado que eu já tive no ciclismo. Duro???? Tiveram dias que eu ligava pra casa com vontade de chorar!!!
Medias de velocidade absurdas? Raramente elas passavam dos 30 e poucos kph, mas a maneira como o treino era distribuído foi o que mais me chamou atenção. A hora que era pra fazer força, o negócio andava muito forte em compensação as partes de baixa intensidade eram passeio ciclístico da primavera. Para alguém ligado em medias parecia fácil, afinal de contas 4-5h em cima da magrela andando a 30, 32kph não parecem difícil no papel, né? Realmente, no papel nada é difícil, parafraseando minha coach, “o papel aceita tudo”. Só que minhas pernas não aceitaram aquilo como no papel... ainda me lembro de passar alguns dias acordando encharcado a noite, como se estivesse com febre, as pernas latejando, e no apogeu da minha forma física, subir escadas era algo que cansava demais!
A partir daquela semana revi tudo que eu achava que sabia sobre treino de ciclismo (como se eu soubesse alguma coisa). Claramente, intensidade e volume são coisas que devem ser muito bem dosadas, os sistemas acabam “conversando entre si” e no final a soma das partes resultam num todo. Se você, como eu fiz muito tempo, pedalar (ou treinar qualquer coisa) volumes insanos com intensidades baixas, é nisso que você vai se transformar, em alguém bom em pedalar (nadar, correr, etc..) por horas e horas, devagar!
Meu grande amigo e parceiro, Adriano Martins, costumava brincar comigo que se fosse pra sair num treino de 200km ele tinha que acabar comigo nos primeiros 40km... Eu sempre achei que fosse sacanagem dele, mas depois de juntar as peças eu entendi muito bem o que ele queria dizer!
Ok, mas e daí? Qual a sacada para o triathlon?
Bom, a gente costuma ser taxado como atletas de uma marcha só, nadamos, pedalamos e corremos numa mesma zona de intensidade, sempre! E isso, embora cruel por parte dos atletas de uma só modalidade não deixa de ter um fundo de verdade... É só você ir pra pista de atletismo com corredores ou pra piscina com o pessoal da natação e vai ver que eles tem uns 3-4 “paces” que a gente desconhece.
Se eu fosse treinar para um Ironman (levando em consideração só o ciclismo, num revezamento por exemplo), eu iria dividir minha preparação em fases diferentes, onde eu tentaria ficar o mais rápido possível, para distancias curtas e depois me tornar específico. Alguma coisa como treinar para um CRI de 20km até o final de fevereiro e depois colocar volume. No mar tem um ditado que “a maré atinge todas as embarcações do mesmo jeito” pode ser um petroleiro ou um barquinho de pesca, eles sobem ou descem o mesmo tanto de acordo com a maré. E este é o conceito por traz deste “approach”, colocar o teu limiar o mais alto possível, antes de mexer com a endurance – lógico que para isso eu estou considerando o ciclismo como um esporte isolado. Mas como o triathlon é um esporte e não a soma de 3 esportes isolados, não é tão fácil assim, e aí entra a figura do técnico!
E os períodos de MEGAVOLUME? Com certeza esses tem espaço, vez ou outra colocar um bloco de 2 a 4 dias de volume acabam trazendo muitos benefícios, desde que eles sejam em intensidades baixas para poder “agregar” aos treinos de limiar. A intensidade intermediária nesse caso (e em muitos outros) acaba prejudicando muito mais do que ajudando.
Bom, a comilança das festas de final de ano já passaram, a semana de férias com a molecada na praia já acabou e esta semana voltei aos treinos para a temporada de 2010 pra valer. Promete ser uma temporada com vários “novos desafios” e na medida do possível pretendo compartilhar aqui.
Minha esposa esta passando hoje por uma cirurgia nos joelhos (pra reconstituir a cartilagem) e eu to de “off” no hospital, por isso tanto tempo pra escrever J - No último final de semana saiu no Esporte Espetacular uma matéria sobre o procedimento pelo qual ela esta passando, é uma técnica nova e estamos torcendo para que funcione conforme o prometido!