Lances do Tour


Embora tenha sido a volta “oficial” de Lance Armstrong ao Tour de France, 4 anos após a últimas das suas 7 vitórias consecutivas, definitivamente não se trata mais dele. Lógico, todos vão dizer (como já ouvi muitas vezes) “o cara ficou 4 anos sem competir, voltou e ficou em 3o no geral, não ta bom?”

Simples e direto: Não, não está bom! Ele não tinha o direito de ir brigar por terceiro lugar... não o homem que venceu o câncer, a morte, e 7 vezes a prova de estágio mais dura do mundo. Simplesmente ele não podia ter ido lá pra brigar por terceiro e ponto final. Ele saiu de um pedestal para mostrar-se um mortal comum, que sofreu muito e foi batido como nunca em todos os aspectos da corrida. Ponto final!

Esse ano não houve disputa pela geral do Tour de France, ele começou e terminou com todo mundo já sabendo quem seria o campeão – ele, o espanhol Alberto Contador, mostrou que é o melhor ciclista da atualidade. Eu se pudesse, teria apostado dinheiro nele 3 semanas atrás sem a menor chance de errar. Mas até a mim ele surpreendeu. Bater o Suíço Fabian Cancellara num CRI realmente foi o ápice de uma performance assustadora, só espero que por trás disso a gente não descubra mais um “super médico”.

Eles tinham tudo nas mãos, tanto Lance Armstrong quanto Alberto contador contavam com uma equipe galática (e talvez somente esse fosse o grande desafio para ambos, lidar com várias estrelas juntas) – A coisa era tão desbalanceada que durante grande parte da prova a Astana contava com 3 ciclistas entre os 5 primeiros, e se tivessem trabalhado mais em conjunto poderiam chegar ao feito inédito de 3 membros da mesma equipe no pódio final, sim, pois o ataque “sem motivo” do Alberto Contador na etapa de quarta-feira última acabou causando danos em seus próprios companheiros e equipe e ajudando os irmãos Schleck na classificação geral.

Mas chega de blá blá blá, e falemos das duas grandes revelações do Tour – não, nada de Lance, nem Contador nem Cancellara...

Os dois grandes nomes do Tour esse anos vieram da Inglaterra:

Primeiro o grande sprintista Mark Cavendish – o homem mais veloz em cima de uma bicicleta hoje em dia. Ganhou seis etapas do Tour deste ano, ainda tenho que procurar, mas puxando pela memória não me lembro de um feito desses. A história é a seguinte: se ele estiver no bolo no último kilômetro, a disputa é por segundo colocado. Ele é tão estupidamente superior que os outros sprintistas disputavam para ficar na roda dele – algo que normalmente ajuda quem vem atrás, o problema é que nesse caso ninguém conseguia nem tirar de lado.

Como um bom ciclista de pista, Mark Cavendish tem uma potência de explosão assustadora, mas o que mais chamava atenção em seus sprints era a cadência que ele usava para acelerar a bike. Sprintistas são conhecidos por manter cadências altíssimas com potência e velocidade assustadora, mas comparado ao britânico, os outros sprinters pareciam estar fazendo sessão de força, com marcha pesada.

Pra quem não conhece da história dele, Mark Cavendish é campeão do mundo de Madison (prova de pista onde ciclistas revezam por 60km com um puxando o outro) e durante o Tour do ano passado abandonou nas etapas de montanha após ter vencido 4 etapas no sprint, para se dedicar ao treinamento para a prova de Madison nas olimpíadas. Evento esse que entrou como favorito, uma vez que era o atual campeão do mundo mas ironicamente foi o único membro da equipe de pista britânica que não trouxe uma medalha para o pais, e foi muito criticado por isso.

Lógico, que um sprinter não se faz sozinho, e Mark Cavendish contava com o maior e melhor apoio de uma equipe impecável. A Columbia High Road é a equipe mais vencedora esse ano no Pro Tour, eles tem alguma coisa como o mesmo número de vitórias que todas as outras equipes juntas, e isso não porque eles tem os melhores sprinters, mas porque eles tem a melhor equipe de “embaladores”. Pra quem assistiu alguma das etapas que o Cavendish ganhou viu como funcionava o “expresso” Columbia. Eu tive a oportunidade de ver um arquivo de potência de um dos embaladores da equipe, o homem que lançou Mark Cavendish na chegada para sua 2a vitória, e ele simplesmente para de acelerar acima dos 66kph, nisso o incrível britânico pula e provavelmente cruza a linha de chegada acima dos 80kph...

Mas, ironicamente ele não levou a camisa verde dos sprinters, esta ficou para o Norueguês Thor Hushvd, que não bateu o britânico em nenhum sprint (a única etapa que Hushvd ganhou foi a que teve uma quebra no pelotão e o britânico ficou na segunda leva... Chris Carmichael escreveu em sua coluna na Pez Cycling que um ano, o Alemão Erik Zabel ganhou a camisa verde sem ter ganho nenhuma etapa se quer no sprint, e que nesse ano, mesmo tendo ganho 6 etapas, Cavendish foi pra casa sem a verde... coisas da regra, e como regra é regra não cabe a mim discutir!

O outro britânico de ouro é Bradley Wiggins, nada mais que 3 medalhas de ouro olímpica! Onde? Acertou, no velódromo!!!!

Wiggins foi campeão de perseguição individual (aquela prova longa de 4km) em Atenas, e repetiu o feito em Beijing juntando ainda mais um ouro na perseguição por equipes (onde a Grã Bretanha bateu o recorde mundial de quebra).

Assustador, é como um ciclista desses sem nenhum histórico relevante em estrada vai para o Tour de France e quase garimpa um pódio, terminando em 4o lugar a segundos do mr. 7x campeão Lance Armstrong???

Mais impressionante ainda é pensar que ele perdeu esse pódio por conta de uma equipe muito mais fraca, pois na duríssima etapa de quarta-feira passada ele sobrou sozinho sem companheiros de equipe com os grandes tubarões e teve que se defender nas duas últimas montanhas, o que fez ele tomar um tempo extra e com certeza drenou suas energias.

Wiggins perdeu 7 kilos nos últimos 2 anos para conseguir uma relação peso x potência grande o suficiente para brigar nas montanhas (bom já que potência ele já tinha por ser um demônio na perseguição ele só precisava perder peso sem perder força, e foi o que ele fez).

Mas pra quem assistiu a etapa do Mont Ventoux, viu que mesmo sendo muito potente e com um peso bom ele sentia falta de uma “caixa de fósforos”mais cheia, pois se eu contei umas 3-4 acelerações que ele conseguiu responder foi muito, depois o pessoal atacava, abria e ele mantendo o “passo”e a força trazia de volta. Foram inúmeras as vezes que eu vi a quarta colocação dele escapar e esse “monstro” buscava de volta!

No geral foi um excelente Tour, marcado muito mais pela briga pela 3a colocação do que pela geral, e com (por enquanto) somente um caso de dopping.

A parte triste foi o tombo do monstro Jens Voight, que caiu na 2a semana e se machucou seriamente. E, obviamente o dopping do Danilo DiLucca L

Nenhum comentário: