Décimoquinto


Honestamente eu não entendo toda essa comoção que tomou conta dos blogs e twitters sobre a etapa de ontem do Tour de France.

Antes de mais nada, quero deixar bem claro que não gosto do Alberto Contador, nem do Andy Schleck. Por motivos completamente diferentes, o primeiro não inspira confiança desde sua suposta parceira com o Dr. Fuentes (Operação Puerto) e o segundo porque na minha opinião não é merecedor (ainda) de uma camisa amarela por não ser um ciclista completo. Se tivesse que torcer pra qualquer um deles, eu optaria pelo Schleckinho somente pelo apelo de ser jovem e mais nada.

O que não entra na minha cabeça é que nessa onda de “torcida” pelo mais novo, o Espanhol começou a ser crucificado como se ele tivesse arrancado a corrente da bicicleta de Andy Schleck de propósito, e depois atacado pra deixar o camisa amarela pra trás.

Era o fim de uma subida duríssima, a mais de 2000m de altitude, na parte final de uma etapa igualmente dura e já no decorrer a 3a semana de uma das provas mais duras que o homem já inventou. Nesse contexto, o “caçulinha” do pelotão e detentor da camisa amarela resolveu atacar perto da marca de 1km para o fim de uma montanha de HC.

Seu concorrente direto, Alberto Contador partiu logo atrás para neutralizar o ataque e “possivelmente” contra atacar. Nesse momento caiu a corrente do primeiro. Nunca vai se saber a causa, mas na minha (pouca) experiência, correntes não caem por acaso – pode ter sido falha do atleta na troca de marcha, má regulagem do equipamento, etc.. E, o agora anti herói espanhol, prosseguiu em sua empreitada, juntamente com outros dois candidatos ao pódio em Paris - diga-se de passagem. Terminou a etapa 39s na frente do Andy Schleck e tomou-lhe a camisa amarela.

Pronto... tinha sido cometido o maior pecado do mundo do ciclismo aos olhos de alguns.

O engraçado é que nessas horas, ninguém leva em consideração que aquilo é uma corrida de bicicletas, e que os mais de 200 atletas que largam na prova estão lá para competir, não pra tomar champagne em cima do selim no Champs Elisée.

Assim que eu assisti a etapa eu fiquei indignado com os ataques ao espanhol, e até comecei a “gostar” dele. Afinal de contas, Schleck não tinha sido derrubado por uma sacolinha e nem parado por um padre irlandês.

Fiquei me imaginando à 2000m de altitude, tentando neutralizar um ataque fulminante, no máximo das minhas forças e já completamente focado nisso. Sem oxigênio no cérebro e mirando naquela camisa amarela que eu tanto queria pra mim... A hora que eu visse meu oponente diminuir o ritmo o que eu ia fazer era “passar voando” por ele e “dar na cabeça” como diria o Celso Anderson (na gíria do ciclismo J). Sinto muito, mas nessa hora a última coisa que eu iria querer saber é o porque ele diminuiu... se caiu a corrente por “acidente” ou por problema de “inoperância”. É uma corrida, pelo amor de Deus... ele não é da minha equipe e é meu oponente direto. Depois, na linha de chegada ele me explica tudo!

Só pra lembrar, na etapa dos Pavês tanto Lance Armstrong quanto Alberto Contador furaram o pneu, o que nesse caso poderia ter sido considerado como uma fatalidade, ou não já que era esperado furos e tombos numa etapa que se dava grande parte em paralelos, sei lá... Mas ambos eram concorrentes diretos à camisa amarela juntamente com Andy Schleck, e ele não parou para esperar ninguém – a propósito, aquela margem de 31s que ele tinha sobre o Contador foi toda construída nesse dia!

Ainda podem falar sobre a ética do pelotão e suas "leis"...

O pelotão tem sua maneira de impor a ética, no caso de ontem, haviam mais dois candidatos ao pódio e que provavelmente vão tirar posição do Schelckinho no último CRI que estavam junto no “ataque”. Se fosse de senso comum o “erro” eles teriam forçado o espanhol à esperar, o que não aconteceu. E, se o resto do pelotão entender que ele foi desleal, com certeza ele vai acabar pagando por isso mais cedo ou mais tarde, uma vez que esses caras correm juntos a “vida toda”.

Alguns comentários excelentes sobre o tópico apareceram no Twitter entretanto:

Taylor Phinney (esperança americana sub-23) disse: “Sinto pena do Schelck pelo azar de hoje, mas também sinto pena do Contador pois vai ter que aturar um monte de ‘sh..’ por causa disso” e depois emendou “Mas se eu fosse um ás nas montanhas, excelente no CRI e com dois títulos do Tour eu provavelmente teria esperado”

E o grande Chris Boardman mandou: “Pergunta: estava Andy Schleck usando um ‘chain guard’? Se não foi uma opção dele, se sim como a corrente pode escapar?” e hoje mandou “Pergunta: se eu estou com a camisa amarela e opto por usar um super pneu leve que vai me dar vantagem mas vai furar toda hora, os outros devem ficar esperando por mim?”

Bom, é pra se pensar...

LODD

5 comentários:

Max disse...

Lodd,

apoiado. Quem acha que ele deveria ter esperado ou nunca correu de bicicleta em subida daquele tipo, ou merece o Mother Theresa of Calcuta Jersey.

ab.

m.

Max disse...

Lodd,

apoiado. Quem acha que ele deveria ter esperado ou nunca correu de bicicleta em subida daquele tipo, ou merece o Mother Theresa of Calcuta Jersey.

ab.

m.

Anônimo disse...

Para mim, o comentário do Menchov resume bem o episódio:

"Na televisão pode ver-se bem, mas na corrida, com 200 batimentos por minuto e com milhares de pessoas a gritarem na beira da estrada, o instinto manda-te seguir pra cima até onde o corpo aguentar"

Parabéns pelo post, excelente texto.

Zebedeu

Bel disse...

Lodd,
Pois cá estou eu, que nunca corri de bicicleta(e mal sei passear)a apoiar seu artigo.
Foram claras suas considerações. A comoção foi tanta, veio num crescendo, e parecia mesmo que o Contador tinha arrancado a corrente da bike do rapaz.Como tudo para mim é muito novo, fiquei confusa num primeiro momento com a enxurrada de opiniões condenando o Contador. E comecei a discordar ao pensar em situações semelhantes de outras provas e no que já tinha acontecido no início do Tour.

Bem, resumindo seu artigo é esclarecedor.
Um abraço
Bel

Bruno D'Angelo disse...

Lodd, com toda essa sua ótima explicação sobre o fato, faço uma relação com um post que o Max colocou no blog dele, e te pergunto (meio que afirmando também):
- Dá prá aceitar que tem gente que acha que o TdF não é (ou não dá) um espetáculo?

Abraço.